Atendimento de Saúde para a Comunidade LGBT+ no Rio Grande do Sul
Pessoas da comunidade LGBT+ ainda enfrentam discriminação e necessidade de justificar sua presença durante atendimentos de saúde. Para enfrentar essa realidade, serviços públicos buscam oferecer um cuidado de qualidade, em ambientes que respeitam a identidade de gênero e a orientação sexual.
O Rio Grande do Sul conta com pelo menos 24 locais que oferecem serviços de saúde especializados para a comunidade LGBT+ por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Esses ambulatórios estão distribuídos por 16 municípios e oferecem desde acolhimento psicológico até terapia hormonal e cirurgias de afirmação de gênero.
Ambulatórios para a População Trans
Os ambulatórios destinados à população trans, travestis e pessoas não binárias estão localizados em Porto Alegre, com duas principais sedes: o Centro de Saúde Santa Marta e a Clínica da Família Álvaro Difini, na Restinga. O ambulatório central foi criado em 2019 e, devido à alta demanda, foi transferido para o Santa Marta em agosto de 2022, com uma equipe fixada e aumento das horas de atendimento.
A enfermeira Lúcia Souto, responsável pelo ambulatório, relata a necessidade do serviço: “As pessoas não eram acolhidas em outros locais”. Exemplos como o de Nicolas Stivelman, um jovem de 28 anos, mostram como esse espaço pode fazer a diferença. Após uma experiência negativa em atendimento particular, ele encontrou na unidade um suporte adequado e acolhedor.
Atualmente, o ambulatório de Porto Alegre atende cerca de 30 novos pacientes por mês e tem 2.184 pessoas cadastradas. O atendimento é feito por uma equipe composta por médicas de saúde da família, um psiquiatra, psicólogos, enfermeiros e técnicos. Todos os serviços são oferecidos pelo SUS, e a orientação é que os atendimentos sejam iniciados com um encaminhamento da unidade de saúde que a pessoa já frequenta.
Além dos atendimentos médicos, o ambulatório promove projetos de extensão, como fonoaudiologia para adaptação vocal e o Ateliê Ambu T, que oferece atividades artísticas e manuais para a autonomia e geração de renda dos pacientes.
Experiências Demográficas no Ambulatório
Elias, um jovem de 20 anos que se mudou para Porto Alegre, relata uma experiência positiva ao buscar terapia hormonal. Ele começou a terapêutica em sua cidade natal e continuou na capital. Ele afirma: “Foi muito facilitado. Conheço pessoas que lidam com endócrinos particulares em outros estados, e não é todo lugar que tem ambulatório”.
Nicolas destaca a simplicidade do acesso ao ambulatório, apesar da longa espera entre consultas. Enquanto ele resolveu compromissos administrativos de forma remota, a espera entre a consulta inicial e o atendimento com um médico pode durar meses.
A terapia hormonal e cirurgias de afirmação de gênero são fundamentais na transição de muitas pessoas trans, que buscam aliviar a disforia, ou o desconforto em relação ao próprio corpo. A automedicação é uma prática comum entre essa população devido à escassez de informações e dificuldades no acesso a serviços adequados.
Recentemente, novas diretrizes do Conselho Federal de Medicina vetaram a terapia hormonal para menores de 18 anos e aumentaram a idade mínima para cirurgias de 18 para 21 anos, o que gerou preocupações entre profissionais e pacientes sobre os impactos dessas mudanças.
Programa de Cirurgia de Afirmação de Gênero
Em Porto Alegre, o Hospital de Clínicas abriga o Programa Transdisciplinar de Identidade de Gênero (Protig), que é referência nacional para cirurgias de afirmação de gênero. As pessoas interessadas podem enfrentar um processo que, em média, leva mais de dois anos por causa da lista de espera e do acompanhamento necessário.
Criado em 1998, o Protig já avaliou cerca de mil casos e realizado 350 cirurgias. Muitas pessoas de outros estados viajam até o Rio Grande do Sul para se submeter a esses procedimentos, que ocorrem duas vezes por mês.
A psiquiatra Maria Inês Lobato, coordenadora do programa, destaca a importância do apoio às pessoas em transição, uma vez que a exclusão social é um dos maiores desafios enfrentados por elas.
Capacitação Profissional
Para garantir um atendimento qualificado, a Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre investe na capacitação de profissionais de saúde sobre a diversidade sexual. O curso “Promotores de Saúde Integral LGBTQIA+” já capacitou 120 agentes comunitários. Segundo Júlio Barros, coordenador da área técnica de Saúde Integral da População LGBT+, a educação é fundamental para eliminar preconceitos e barreiras no acesso aos serviços de saúde.
Os desafios incluem não apenas a capacitação profissional, mas também a qualificação de cadastros. Com informações adequadas, é possível fortalecer políticas públicas e atender melhor as necessidades dessa população.
O Censo Demográfico de 2022 não incluiu questões sobre gênero e sexualidade, mas o IBGE estuda maneiras de incluir essas informações em futuras pesquisas, com o objetivo de ajudar na compreensão das desigualdades e na formulação de políticas que promovam direitos e equidade.
Com iniciativas assim, a esperança é que o acesso à saúde para a comunidade LGBT+ continue a se ampliar, garantindo atendimento de qualidade e respeito a todas as identidades.